Tinha acabado de chegar àquela casa tão sonhada. Trazia os quadros, os tapetes, os sonhos e o cão. Era preciso pintar tudo outra vez. O inverno tinha tomado conta daquele espaço sem ser capaz de proteger o interior do frio e do vento.
Tudo vazio. A sala, os quartos e o alpendre lá fora. O castanho e o cinzento viviam em comunhão perfeita nas divisões da casa, impedindo que qualquer outra cor ali se instalasse.
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Com os cantos arredondados, permite-me ver que várias folhas comprimidas compõem esta fotografia. Alguns riscos profundos rompem a imagem sugerindo que este registo fotográfico não viveu num álbum mas sim na carteira de alguém. Atrás pode-se ler – foto beleza, Porto - data ilegível. Traz com ela um perfume floral que se mistura com pó da casa. Consigo de olhos fechados sentir o seu peso na minha mão, como também se faz ouvir quando a pouso na mesa em frente.
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Apito em metal prateado com cerca de cinco centímetros de comprimento. Enferrujado por dentro mostrando que alguém usou e lhe bufou. Agarrado a ele uma argola que prende dez...doze chaves, seis cobertas de ferrugem revelando o seu abandono, as outras foram usadas até há menos tempo uma vez que o castanho vence o prateado. Conjunto pesado e frio com cheiro a ferro e do quintal lá de fora.
Garfo largo e pesado, com uma moça no cabo. Cinco dentes desalinhados, dois apontam para fora. Deve ter sido usado para um fim que não o original, comer.
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Ali está ele na esquina da rua onde passa o autocarro. Pose atlética, despida de músculos e de força para saltar na vida. Veste o mesmo casaco de pele castanha que esconde o seu emagrecimento progressivo.
Olha tudo e todos sem ver nada, apenas o mundo que criou e que é dono dele. Crava um cigarro a este, a outro e a mim se estiver por perto. Nem sempre tem trocos, ou melhor nem sempre tem um obrigada. Estende a mão castanha e suja com cheiro a erva, entrando muitas vezes num monólogo imperceptível enquanto se cumpre o ritual de pegar no cigarro.
Hoje decidi procurá-lo. As minhas idas ao supermercado ou à escola do Vasco tinha de passar por ele e assim foi.
- Arranja-me um cigarro...
- Claro. Que tem hoje? Nada havia de diferente nele em relação aos outros dias, foi apenas o atirar do anzol.
- Hoje?... Hoje estou só como nos outros dias. Comecei este caminho há dez anos, entretanto ela foi embora... Levantei-me com o único objectivo de fumar este cigarro.
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Gostei muito de poder ler os teus textos de que tinha algo na memória de quando os leste. E lembrei-me também dos comentários do nosso professor, por exemplo, quanto à tua capacidade de descrever os objectos, num dos exercícios.
ResponderEliminarPareceu-me uma óptima ideia publicarmos aqui estes textos.